Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono

Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono. O que é?

O Sindroma de Apneia Obstrutiva do Sono (SAOS) é um problema respiratório do sono que se caracteriza por episódios repetidos de interrupção da respiração, apesar de continuar a desenvolver-se esforço para respirar. Apneia obstrutiva é a cessação completa da passagem do ar pelo nariz e pela boca, durante 10 segundos ou mais. Um doente típico terá 5 ou mais apneias por hora de sono. Entre estas pausas respiratórias quase sempre o doente ressona ruidosamente. Como o sono nocturno está sujeito a frequentes interrupções, o doente tem habitualmente uma sonolência excessiva durante o dia. O SAOS pode prejudicar gravemente a qualidade de vida e aumentar do risco de doenças cardiovasculares e de morte súbita. Além disso estes doentes têm maior probabilidade de acidentes de trabalho e de viação. Sendo uma situação séria e potencialmente mortal, deve ser diagnosticada e tratada eficazmente. Existe um outro tipo de apneia do sono, a apneia central, em que as vias aéreas não estão obstruídas, e que ocorre quando o cérebro falha no envio ao diafragma do estímulo para a respiração. A apneia central é muito menos frequente que a obstrutiva.

Qual a frequência?

O SAOS pode existir em todas as idades, mesmo nas crianças. Estima-se que na meia-idade (entre os 30 e os 60 anos) 2% das mulheres e 4% dos homens têm apneia obstrutiva do sono com sonolência durante o dia. As pessoas com maior probabilidade de ter SAOS são as que ressonam alto e ao mesmo tempo têm excesso de peso, ou hipertensão arterial, ou que têm anomalias anatómicas do nariz ou garganta.

Quais são as causas?

Quando a pessoa adormece, os músculos da faringe relaxam tornando-se flácidos, o que leva ao colapso e obstrução parcial das vias de passagem do ar (vias aéreas superiores) provocando ressonar e restrição da respiração ou mesmo obstrução completa (apneia). Apesar disso, o doente faz esforços persistentes para respirar com os músculos do tórax e do abdómen, principalmente o diafragma. De cada vez que acontece uma apneia há uma descida do nível de oxigénio no sangue. Após algum tempo (10 a 60 segundos), o esforço respiratório para vencer a obstrução leva ao alerta do cérebro, e provoca um acordar momentâneo o qual restaura o tónus dos músculos das vias aéreas superiores. Assim, a apneia é interrompida por este breve despertar, tão breve que a maior parte das vezes é imperceptível. Então a respiração recomeça até que o doente caia novamente no sono, e volte a haver relaxamento muscular da faringe. Este círculo de acontecimentos pode repetir-se centenas de vezes em cada noite. Situações estruturais do nariz (desvio do septo) ou congestão devida a alergias ou a resfriado comum, podem, isolados ou combinados, agravar o colapso da vias aéreas aumentando o ressonar. A obstrução nasal leva à respiração pela boca, com deslocamento do maxilar inferior, que faz com que a base da língua se encoste à parte posterior da garganta, favorecendo a apneia. A obesidade, provocando depósitos de gordura na garganta, o aumento do tamanho da língua e da úvula (“campainha”), certas deformidades mandibulares (do queixo), amígdalas e adenóides volumosas, favorecem o aparecimento de SAOS. Alguns medicamentos (tranquilizantes, anti-histamínicos) e álcool, irritantes inalados (fumo do tabaco) têm efeito semelhante. Também algumas doenças endócrinas predispõem para o SAOS.

Como prevenir?

Medidas de prevenção são todas as que possam corrigir os factores de risco de apneia do sono: a extracção das amígdalas e adenóides nas crianças, e a diminuição do peso nos adultos obesos são as mais importantes. O tratamento das anomalias nasais ou faríngeas e dos defeitos ósseos faciais, bem como a evicção de consumo de álcool, de comprimidos para dormir e de tabaco, podem evitar o aparecimento ou agravamento da apneia do sono.

Como se manifesta?

As principais manifestações do SAOS ocorrem durante o sono, sem que o doente se aperceba delas. Durante o dia, são os colegas de trabalho ou amigos que notam que a pessoa cai a dormir em alturas menos apropriadas. Como a evolução é quase sempre muito lenta, ao longo de vários anos, o doente só tem a percepção do problema quando acontecem factos graves (adormecimento ao volante, acidente de trabalho). Por isso é muito importante que a pessoa que partilha o quarto de dormir testemunhe o esforço visível para respirar, as características do ressonar, e as interrupções da respiração, durante o sono do doente. O ressonar (roncopatia) é o sintoma nocturno mais relevante do SAOS. Tem origem na vibração dos tecidos moles da garganta quando a pessoa inspira, abrindo e fechando alternadamente a passagem do ar. A intensidade e o tom do ressonar dependem da quantidade de ar que passa na via aérea, e da rapidez da vibração. Além do ressonar, o síndroma de apneia do sono pode manifestar-se durante a noite por um sono agitado e com interrupções, crises de sensação de sufocação, urinar várias vezes por noite, sudação aumentada, refluxo gastro-esofágico (passagem do conteúdo ácido do estômago para o esófago). Os doentes queixam-se muitas vezes de insónia, assim como de dores de cabeça, secura de boca e cansaço ao acordar. A sonolência é o sintoma diurno mais notório no SAOS, e resulta do facto de o sono nocturno ser fragmentado e mais superficial. O sono normal tem uma arquitectura própria evoluindo por ciclos ao longo da noite, passando do sono leve ao sono mais profundo, e à fase dos sonhos ou sono REM. Num doente com SAOS, essa arquitectura normal do sono pode estar muito alterada pelos frequentes despertares. Durante o dia o SAOS também pode manifestar-se por diminuição da concentração e do desempenho, incluindo no trabalho e na condução automóvel. Pode haver perda de memória e alterações do humor e da personalidade (depressão, irritabilidade), e problemas sexuais. Cerca de 50% das pessoas com apneia do sono têm hipertensão arterial. O risco de ataque cardíaco ou cerebral é elevado nas pessoas com SAOS.

Qual a evolução?

Ressonar é muito comum em ambos os sexos, mas é duas vezes mais frequente no masculino. Aproximadamente 30% dos homens de 30 anos, e cerca de 40% das pessoas de ambos os sexos, com 50 anos de idade, têm roncopatia. O facto de ressonar não significa que a pessoa tenha um SAOS requerendo tratamento; isso só acontece em 10 a 35% dos casos. Contudo o ressonar só por si é preocupante porque, em qualquer dos casos, representa uma respiração anormal durante o sono. Pensa-se que a roncopatia pode evoluir para um SAOS. A história típica começa pelos 20 e poucos anos com um ressonar contínuo, inocente. Com a idade e o aumento do peso, ao chegar aos 40 anos, o ressonar é já intenso e intermitente, intervalado por movimentos frequentes provocados pelos despertares momentâneos. Pelos 45 anos o indivíduo começa a notar sonolência diurna. Muitas vezes, só mais tarde, pelos aos 50 ou mais anos, é que finalmente o SAOS é diagnosticado.

Como se diagnostica?

O estudo poligráfico do sono nocturno é o melhor teste para o diagnóstico da apneia do sono. Através dele regista-se, durante uma noite inteira, uma série de funções durante o sono, tais como a actividade eléctrica do cérebro, os movimentos dos olhos, a actividade muscular, o electrocardiograma, o esforço dos músculos respiratórios, a respiração nasal e bucal, o nível de oxigénio no sangue. Os estudos poligráficos do sono são habitualmente realizados em centros especializados aonde o doente se desloca para dormir; a sua realização implica uma diferenciação técnica importante. Actualmente é possível fazer certos estudos simplificados em casa do doente com aparelhos portáteis. Em rigor, estes exames não podem ser considerados estudos do sono, e dão uma informação limitada.

Qual o tratamento?

A terapêutica depende das características clínicas de cada indivíduo e do resultado do estudo do sono. Evitar o álcool, o tabaco e os hipnóticos, perder peso, e não dormir deitado de costas, fazem parte do programa terapêutico. A terapêutica mais eficaz é o CPAP-nasal (ventiloterapia com pressão positiva contínua por máscara nasal). É um tratamento de natureza mecânica em que o doente dorme com uma máscara sobre o nariz, por meio da qual o ar sob pressão é forçado através das narinas. A pressão do ar é gerada por um aparelho simples, e ajustada de modo a ser a suficiente para evitar o colapso das vias aéreas. Este tratamento impede as apneias e possibilita um sono repousado e continuado. A sua prescrição pressupõe um estudo poligráfico do sono prévio. Em certos casos de SAOS ligeiro ou de roncopatia isolada, têm mostrado resultados as peças orais aplicadas às arcadas dentais. Estes dispositivos, geralmente preparados por estomatologista, funcionam reposicionando o maxilar inferior e a língua. A cirurgia ORL pode ser benéfica nalguns casos bem seleccionados. Tem a finalidade de aumentar o diâmetro da via aérea. Existem vários procedimentos, desde a remoção de amígdalas e adenóides, pólipos ou outros causas de obstrução, à correcção de deformidades estruturais. A UPPP (uvulopalatofaringoplastia) consiste na remoção do excesso de tecido mole na parte posterior da orofaringe (amígdalas, úvula, e parte do palato mole). A uvulopalatoplastia por laser (LAUP) ou por energia de radiofrequência (RFUP) faz-se sobretudo para tratar a roncopatia, mas não elimina a apneia. Sempre que haja indicação para procedimento cirúrgico, deverá fazer-se previamente um estudo poligráfico do sono. A finalidade deste é detectar uma possível apneia, antes que a cirurgia faça desaparecer o principal sintoma “marcador” do SAOS que é o ressonar. Alguns procedimentos cirúrgicos maxilo-faciais podem estar indicados quando há deformidades do maxilar inferior.

Qual o prognóstico?

O prognóstico desta situação é condicionado sobretudo pelo aparecimento de complicações cardiovasculares. O tratamento com CPAP nasal altera substancialmente o prognóstico da doença, uma vez que tem efeito na gravidade da hipertensão arterial e das arritmias cardíacas, e melhora a função cardíaca. Centros de tratamento, Organizações de apoio: Todos os hospitais centrais do país estão apetrechados para o diagnóstico e tratamento do SAOS. Alguns especialistas de neurologia, pneumologia e psiquiatria estão habilitados para a execução de estudos do sono, em medicina privada.

 

Artigo de:

Dra Isabel Simões Melo – Pneumologista – 28-Mai-2001

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